DE POMBOS E MINOTAUROS

 

 

MINOTAURO

 

O pombo morto esparramado no chão

Fere meus olhos.

Suas asas esmagadas,

Corta meu coração

Penso naqueles que não podem voar

Em tantas asas que foram esmagadas,

Nos voos, que como sonhos, foram perdidos.

Não do pássaro,

Mas das pessoas que vejo nas ruas.

Essas pessoas que usam camisetas gastas,

Chinelos e rasteiras e bermudas

Roupa barata, cenho franzido,

Sorriso difícil,

Olhos baços.

Movem-se em lentas gravidades de pobreza

Neste labirinto de ruas sem esperanças.

Dizem que pombos são pragas,

Doenças com nomes difíceis,

Que eles espalham por aí.

Essas pessoas que vejo nas ruas,

São como os pombos

E suas pragas,

Aos olhos de gordos Minotauros,

Que em largos sorrisos

Ostentam seus carros e motos último tipo

Pelo intricado labirinto das ruas estéreis

Que orgulham-se ter construído

Enquanto isso gaviões em pios falsos de alto falante

Substituem os sinos da Matriz.

Berrando em alto e bom som:

Longe de nós, Pombos malditos,

Longe de nós, suas pragas.

Longe de nós, em nome de deus.

Mas, no alto da igreja

Há vitrais da Bavária,

Com pombos radiantes retratados.

Auréolas de santíssima pobreza,

Espírito vivo na face dos santos.

Compaixão e misericórdia em cores vivas.

Logo abaixo, no altar, sob o olhar estarrecido do Pombo e seus mártires, os Minotauros são consagrados com bênçãos e hóstias.

Nesse terrível espetáculo de sagrada hipocrisia,

que ousaram chamar de vida

 

William Blake - Satan Smiting Job with Sore Boils

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