CRÔNICAS DO INSANATÓRIO - XIV–FINAL

 

 

 

jaime

Quando voltou a si, certificaram-se que estava “gel”, “lassie”, “bonzinho”. Ele disse que estava. A ressaca do sossega-leão era brava. Não havia como não ser bonzinho. Grogue, trançando as pernas, deixou a sala de detenção, no fundo da enfermaria, cruzou-a em direção a porta que dava para o corredor da clínica, saí.

Ela estava lá. Denise, a bruxinha dente de sabre. Levou-o para a cama do quarto dele, Cícero tentou resistir, tentou conversar, queria dar uma volta. Em vão. Ela o calou e, quando chegaram ao quarto, empurrou-o para dentro, virou-se e foi embora.

Ele caiu na cama e fechou os olhos.

Alvorada, manhã, meio dia, meio da tarde...

O sol o desorientava, machucava sua vista, prejudicava seu raciocínio.

Só se orientou a noite.

Então saiu para jantar. Tomou seus remédios. Voltou para a cama.

Dormiu profundamente.

No dia seguinte, quando acordou, notou que seu corpo não respondia. Foi incapaz de ir à academia. O lance da magia perdera a graça. Ele começou a se lembrar da casa que destruíra com maior nitidez. Começou o cair em si.

Deu conta de sua própria loucura com exatos: 20 mg de Olanzapina e 2000 mg de Depakote.

Delírio encerrado.

E muito arrependimento.

Então Denise perdeu o interesse nele. Ela começou a se sociabilizar com os outros internos e deixa-lo de lado.

Ele não se importou.

Estava ocupado, remoendo a consciência de sua loucura.

Delírio Tamanho jumbo. Ele sentiu-se um rato por isso, por delirar, e pior, curtir o delírio...

Culpa ultra-jumbo.

Um fodido da cuca era o que ele era.

Foi o que disse para a o representante da família, no primeiro telefonema que conseguiu fazer..

--- Sou um lelé da cuca, isso é o que eu sou. Eu queria que a família pedisse perdão para mim, olha que aburdo, por isso não ligava, mas agora me arrependi, juro, por isso estou ligando. Estou muito melhor, juro, não preciso mais ficar aqui...

--- A gente sabe que você está melhor -dizia o representante da família, e continuava:

--- O médico nos conta. Você melhorou muito Cícero. Agora tem que mostrar estabilidade. Mais duas semanas, foi o que os médicos disseram. Talvez menos, só depende de vc...

--- Estabilizar é... – respondeu Cícero desanimado. Aquilo ia levar mais ou menos um mês. No mínimo. E não, não dependia dele... Mas ele ia dar o máximo de si para isso.

Suportou a Luta Livre com serenidade. Foi ator, nada o perturbava. Estava tranquilo.

--- E muito sem graça... – acusava Denise.

--- Quero sair daqui. Vc mesma disse, fingir, ser ator. Estou encarnando o paciente ideal. Quero ver se acelero minha alta, entende?

--- Não. Não entendo quem é você realmente... A pessoa com quem convivi não era assim.

--- Eu estava eufórico, Dê. Agora só quero sair.

--- Sair, sim, mas é esse o preço? Perder o encanto? Nem a pau Juvenal.

Virou-se e começou a marchar, sacando um maço do bolso e levando um cigarro à boca.

--- Não quero sacrificar mais nada por este lutar – gritava enquanto afastava-se de Cícero.

Uma semana depois, a mãe de Denise estava lá, sorrindo de orelha e orelha.

Denise teria alta em 24 horas.

O que fizeram para acontecer isso permanece um mistério hoje.

Duas semanas depois, absolutamente sereno, Cícero saiu para uma readaptação monitorada. Devia retornar a Luta Livre uma vez por semana para seu desenvolvimento ser acompanhado até a alta de fato.

Depois de um mês de acompanhamento, morando na casa da irmã, teve alta.

Foi quando contaram-lhe que havia sido despejado.

Que estava com o nome sujo na praça devido ao despejo que sofrera enquanto estava internado. Não conseguiria outra casa para alugar.

Que a história chegou a seu emprego.

E qie fora demitido.

Surtou de novo.

Foi internado. Fugiu. Está nas ruas.

Delirando...

Onde, exatamente, ninguém sabe...  

          FIM

 

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