AMORES CRIMINOSOS–AS TRAMOIAS DO VICE-PRESIDENTE

PALACIO DO GOVERNO – CAPITAL DO PAÍS
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Ninguém tinha certeza de porra nenhuma. Assessores, aliados, caras de pasta na mão e gravata importada impotentes. Iam e vinham. Buscavam e forneciam notícias a respeito do presidente. Acertaram o fígado, não senhor, não pegaram o criminoso, ele fez um refém, fugiu e matou o coitado.
--- Sabemos quem fez esta zona? A pergunta vem direto da boca fria, fina e ventríloqua do vice-presidente.
--- Senhor, sem câmeras de vigilância, só temos testemunhas. Todas em choque e divergindo em tudo. Poucos pontos em comum. O atirador mascarado e a mulher do carro. De echarpe no rosto. Vistosa e irreconhecível.
---- Mascarado. Vocês deixaram um mascarado chegar perto do presidente? É isto mesmo? – A boca fina como um garrote de náilon contraiu-se irritada.
Silêncio. O vice presidente deu um passo para diante e encarou aquela gentalha bem vestida exalando o fedor do medo.
--- Ajax, por favor elucide estes borra botas.
Um androide entra no Salão do Poder e se posiciona do lado direito do vice-presidente. Um homem de metal, perfeitamente articulado, mas lento e pesado. Como lentos e pesados são os olhos vermelhos que encaram a equipe administrativa do poder executivo como se fossem a porra seca dos mela cuecas que realmente eram.
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--- Estava frio, senhor. Todos naquela cidade andam assim. Moda local. Não pararam todos os cidadãos que usam mascaras. Por um motivo totalmente ilógico, senhor. Por todos usarem máscaras, nenhum foi considerado suspeito. Daí nada ter sido feito, senhor vice presidente.
--- Porcos incompetentes que uma puta pariu, vocês, porra!!! E que puta cidadezinha do inferno. Quem é de lá que dá pra foder? O que tem lá além daquele Haras maravilhoso que o ex-presidente cedeu aos Atallas? Nada, né... Pois bem. Avisem os Atalla que eles passaram para a nossa lista negra. Eles tem 24 hrs para saldar suas concessões estatais ou assino tudo pros sem terra botarem prá quebrar naquelas terras malditamente improdutivas deles.
--- Mas eles contribuíram com a campanha do presidente – ousa dizer um engravatado com corte sob medida, dedo indicador em riste, o gesto teatral caindo no silêncio e no constrangimento.
--- Como está o presidente, meu jovem analista?
--- Em coma, senhor. Sem previsão de melhoras.
--- Então eles não contribuíram para a MINHA campanha. Faça com que sejamos amigos, entende – sussurra algo para o analista que balança a cabeça negativamente, indignado - e os sem terras continuarão infelizes e absolutament sem terras, fui claro? Claro que fui. Por outro lado, tenho um argumento mais imediato. Ajáx...
--- Sim senhor.
--- Laser. – o androide aponta um dedo brilhante em vermelho para o analista - O que tem a dizer, meu jovem analista, meus jovens assessores e lobbistas, tão leais ao antigo presidente que me dão reviravoltas nas tripas. Puta que pariu, não me fodam, porra. Ou Ajax fode vocês. Quem sou eu, galera?.
--- Senhor vice presidente, senhor – todos gritam sem hesitação. Máquinas políticas treinadas meticulosamente para balançar o saco do superior pro lado que balança sua patente....
“Vice””Vice””Vice”.
“NÃO PRESIDENTE”
“AINDA NÃO PRESIDENTE.... RS!”
O vice presidente sorri para eles, com aquela boca fina, sanguessugas fazendo arcos exdrúxulos com aqueles lábios cruéis. Deixa seus fragmentos de pensamento mais íntimos, aqueles que se permite ter enquanto o país e o seu povo o espera pairarem no ar por um momento, como se todos pudessem ouvir seu discurso silencioso. O seu único verdadeiro.
“Sirva-se da pátria, meu rapaz. Na miúda e no salto alto... Mineirinho, mineirinho... 08 anos de investimento presidencial. Depois se mande. Paraíso é aqui e só fiscal.”
Quando termina suas elocubrações, o sorriso morre e sua boca treme num ricto assustador.
--- Vice, eu? – o vice presidente retruca a todos – Ajax, me chamaram de vice presidente. Por favor, se não sou o presidente, tenho competência para descascar o puta abacaxi que nossa pátria pariu, bem aqui nessa mesa? Tenho então competência para pronunciar para a nação como o serviço secreto deixou os cidadãos de toda uma cidade no cú da patavina usar máscaras no dia em que seu presidente foi baleado e está em coma?
--- Senhor, não senhor – urrou o robô.
--- Bem, então vou-me embora, não é mesmo... Fodam-se senhores, bom dia e passar bem.
E o vice presidente empina o peito, acerta o ombro e começa amarchar rumo á saída.
--- Senhor – Uma voz uníssona de desespero ecoa pela sala, clamando pelo vice-presidente, que para e volta-se vagarosamente, apenas para dar um olhar sacana para os escrotos do Executivo.
--- Sim.
--- Senhor Presidente em Exercício... Senhor...
Agora seu futuro se abria. O presidente estava morre-não-morre. E ninguém poderia se por entre ele e o poder absoluto, finalmente.
Regras da democracia, Rá, rá. Ele que esperava por em prática seus planos mais engenhosamente filhos da puta de corrupto em 04 anos, poderia executá-los agora mesmo.
Uma canetada, uma lei a mais na constituição, uma empresa no seu bolso, contas ficando gordas de verdade na suíça. Presidente.... Ele pensou no cargo. Um absurdo. Como alguém pode representar os interesses de milhões de pessoas tão diferentes quanto sal e açúcar. Rá. Ele que não enlouqueceria pensando nisto.
O poder absoluto corrompe. Isto é tudo. E corrompido até a alma era o vice presidente.
E impaciente. Pressionava analistas pagos para procurar fundos perdidos nos computadores superfaturados do Congresso Federal usando a senha de uma deputada, que metia com ele, fim de semana sim, fim de semana não, no imóvel destinado aos congressistas no imenso prédio em frente ao lago artificial. Não falava nada para ninguém, mas procurava um método seguro de eliminar o presidente.
O cara não estava morto, afinal de contas. O Vice governava o país, mas apenas de direito, não de fato. Ainda era Vice, apesar de tudo. Pois, a conjuntura política alijou sua capacidade de implantar novas formas de benefícios sociais, merda. Benefícios estudados para dar sobrevida ao pobre e milhões à suas contas suíças. Seus projetos de lei de incentivo à tecnologia, com suas entrelinhas roliças de possibilidades ilícitas altamente lucrativas. Nada disto havia sido implantado.
Ninguém iria arriscar com ele. Iria terminar o mandado e cair fora para uma anônima aposentadoria, era essa a jogada desses filhos da puta. A não ser que mostrasse quem tinha as bolas nesse território. Porque aqui era a selva. Só um macho mr. Presidente. Só um. Bye. Já vai tarde.
E pensava nisto quando dirigia-se para o hospital presidencial com uma receita de morfina a uma solução letal de 100% de substância pura. Lá, parou na enfermaria e, como quem não quer nada, afanou adrenalina e preparou outra injeção. Òpio na veia, adrena no peito. Overdose e já era, irmão....
E foi dito e feito. Depois, molhou a mão do legista para escrever um laudo de morte natural.
No dia seguinte era presidente da república.
Um dia depois, o líder da oposição no congresso votou num projeto presidencial. Seu voto rachou a bancada da oposição. O projeto presidencial ganhou. Para falar a verdade o líder da oposição nem sabia do que se tratava o projeto. Queria apenas evitar que as degradantes imagens de sua filha fazendo gang bang na festa de réveillon de seu clube não fossem parar no Youtube. Mostraram para ele ontem a noite, todos da equipe presidencial o visitaram. Abriram suas pastas, tiraram um notebook, mostraram o vídeo, fitaram os olhos do líder da oposição. Eles choraram. E o vice presidente ganhara mais um aliado. Pois, para ele, quem chora tem conta a pagar. E o vice presidente fez o líder da oposição chorar como um canário cantaria. Por toda a madrugada.
Ao raiar do dia, se tinha inimigos, também tinha seus podres.
Mas não estava em paz. Nunca estaria enquanto não soubesse quem matara e porque matara seu antecessor.
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