2048– ESLON MUSK II CONTRATACA – A PERCUSSIONISTA SELVAGEM


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A Segunda Tenente Cacau estava, no momento do ataque dos drones, coletando amostras para suas experiências com as sonoridades das aves e o controle subsônico que delas poderia ter na arte da percussão sensorial, mais específicamente no batuque enquanto ferramenta de controle e expansão mental. Imagens de Tainá e Avila pululavam em sua tela. Mas de que adiantavam essas comunicações paras suas pesquisas? Estava isolada em pleno pantanal, ela e sua cabrocha macia, deus, e os pássaros, a linguagem abençoada da alvorada e do crepúsculo. Contrariada pela interrupção, silenciou seu satwacth e concentrou-se na monumental Harpia a sua frente.
Rara como era, única remanescente de uma espécie que, topo da cadeia alimentar, mantinha viva todo um subecosistema agora moribundo. Cacau lançou sua isca, um grito de pardal ferido. A Harpia caiu na armadilha sonora e abriu suas formidáveis asas. Quando a ave branca e de profundos e atentos olhos amarelados como os de um tigre brilhando na mata, abriu o bico para piar, a segunda tenente agiu. Sacou sua microfone laser e com uma torção rápida do pulso, converteu o laser em ondas sonoras reversas que, ao grito da harpia, reverteu o sentido do som, puxando o poderoso som do animal para a caixa materna que, imediatamente converteu-o em algoritmos octogonais e lançou o som novamente ao seu legítimo proprietário, a natureza, ou, pensou Cacau, o bico da Harpia.
O som da Harpia, era dela. E ficaria sempre em seu ombro. Como a coruja de Palas-Atena.
E quem precisa de Escudo e lança com tanto poder, Deusa, concluía a feliz segunda tenente.
Poder, era o que cacau respeitava. Respeito uma ova, corrigiu-se. Não o respeito, essa coisa falsa, essa convenção dos homens acerca de uma coisa que deve ser bem tratada. Como se fosse possível bentratar o que se odeia. E ela era odiada. Por sua opção de prazer, por preferir a umidade macia das de seu sexo do que a secura peluda do sexo alheio. Além de que, pensava ela com seus botões. Coisa de homem, o respeito, uma racionalização para tolerar o que não gosta, mas que já não pode ignorar. Cacau olhava a redor de si.
Não existe respeito aqui, no meio dessa mata, onde caos e ordem, bem e mal, o que o homem chama de respeito e o que o homem chama de desrespeito simplesmente eu chamo de harmonia. Eles tem que conviver juntos morrendo e matando-se, comendo e sendo devorados para conseguir harmonia, tão necessária a natureza, tão vida mesmo onde não se pensa que há vida. Cacau apanhou uma pedra do solo. Tamborilou encima dela. Os sons saíram em ritmo de samba triste, e cacau continuou seus pensamentos ao ritmo do tamborilado. Não há respeito ou compaixão na natureza. Há a luta pelo território, a presa, a caça, o medo, a nóia a glória de ficar vivo por mais um dia, até a hora da próxima refeição.
Havia um ritmo em toda a mata, em todo rio, em todo mar, em todo deserto:
O seu maior predador é a sua saúde a saúde da mata, do rio, do mar, do deserto.
Menos nós. Por isto cacau não acreditava que o homem fosse deste mundo. Não mais. Em algum momento houvera um contato e tudo o que a humanidade construíra em prol e com o mundo deturpara-se. Tornamo-nos um vírus, um câncer. A prova era o que Musk fizera em Marte. No entanto, de uma maneira louca, cacau gostava de Musk. Temia-o. Admirava-o.
Mas seria capaz de meter uma bala em sua cabeça, cuspir na sua cara enquanto morria e esfregar o chão com o sangue de suas feridas se pudesse. Odiava-o.
Fazia parte da admiração de um animal por outro.
É isto o que quero, alguém que, ao chegar na minha hora haja com admiração e odio, não este respeito forjado de vocês civilizados tolos. De vocês, só acredito no que for espontâneo, instintivo e animal. Gente que seja gente e não interações hightech com máquinas que substituem poderes inerentes a nossa natureza. Ah, como posso “respeitar” tamanha imbecilidade. Raros os civilizados gente. E quando eu os encontro, sou fiel até a morte. E você sabe e abusa disso, Tainá.
A segunda tenente saca seu comunicador:
--- Fase 1 da Operação Harpia concluída. Upload subsonoro, agora. Vamos embora daqui.
Sim, Tainá sabia e abusava. E porque não abusaria. Se toda a operação Harpia fosse concluída, Tainá teria o poder de todos os pássaros registrados da fauna brasileira. O que para uma tecnoxamã significava muito poder de fogo.
Cacau podia ser apenas uma recruta pesquisadora especializada em coleta de material científico sonoro em campo, mas sabia que aí tinha coisa. Mas jamais desobedeceria sua venerada Tainá. Quando perguntou, incapaz de esconder sua curiosidade, sua venerada apenas respondeu, um estranho sorriso nos lábios.
--- Proteção contra vampiros, segundo tenente. Apenas isso.....
--- Perdão, senhora...
--- Cautela e respeito, segundo tenente.
--- Não acredito em respeito, a senhora sabe.
Tainá havia virado para ela, os olhos tremendo com um sentimento de presa que tremia numa lagrima que nascia e refluía para dentro de suas pupilas.
--- então medo e raiva, tenente, medo e raiva de uma criatura que me dá horror e de que a rebelião necessita desesperadamente, cacau.
--- Conte comigo no que for preciso, sra.
--- Estaria disposta a vir para saturno comigo, segundo tenente.
--- Claro sra.
Tainá comunica-se com Avila. Avisa que haverá uma voluntária do corpo científico indo para Saturno com ela.
E lá estava ela, uma percussionista selvagem Iorubá, envolvida neste plano maluco de libertar um vampiro sideral que havia explodido uma cidade marciana superpovoada, a casa branca e que agora era torturado para toda a eternidade numa prisão espacial num lugar qualquer entre os anéis de Saturno.

Cela213

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