o golpe–iii- a loucura do cadeirante feroz

Wheelchair_Mob_Extra

Ia explodir toda essa bagaça – minha própria casa – e foda-se.

Ir embora num clarão! Que morte espetacular para minha medíocre vida.

Isso era simplesmente reconfortante.

Já não ligava para a torrente de lucidez indo para o ralo.

Estava doidão. Louco para morrer de tristeza e raiva. Eu podia, havia perdido perna, carreira e família.

Nem meus inimigos me davam crédito, apenas compaixão.

Pois era o que não suportava, e, como já disse, fazia dela meu principal recurso de fonte para a produção de meu show final.

Distribui armas, começando por pistolas e armas de calibre menor pela entrada da casa até o fundo.

Ao fundo havia mocozado no banheiro uma doze.

Acredite em mim, num tiroteio, não sei bem porque, todo mundo vai pro banheiro, o último lugar privado em uma casa que já virou um carnaval de balas, uma orgia de sangue.

E distribui o C4 pelas fundações da casa.

Comigo carregava nos bolsos de minha cadeira de roda customizada, a Uzzi e o fuzil AK-47. Na canela da perna que me sobrou, uma pistola Desert Eagle.

Eu tinha um plano.

Iria gastar toda a munição das armas de calibre menor e fugir.

Meus inimigos são previsíveis. Ficariam assustados e putos, não conseguiriam deixar de perseguir-me. Iriam-me encontrar no banheiro, fortemente armado e os matando enquanto espremiam-se em fila indiana no corredor estreito que dava acesso ao sanitário.

E quando tudo estivesse esgotado, Julio iria explodir comigo, a casa e o que restasse de seus homens.

Rá, talvez ganhasse uma medalha post-mortem por ter acabado sozinho com uma ativíssima gangue de receptação.

Ao menos seria um motivo de orgulho para Eliza e Regina.

O tempo até o “duelo” foi passando...

Eu enganava o relógio fazendo uma porrada de exercícios e treinamentos.

Ria entre os intervalos.

Chorava a noite enquanto azeitava as armas.

Resmungava com fantasmas enquanto afiava lâminias.

Fazia piadas com os entregadores de pizza, hambúrgueres e marmitas, que passou a ser minha dieta diária.

Mal dormia, já acordava, treinava, tomava café, treinava.

Levei garrafas pet para o meu quintal, atarraxei um silenciador que havia descolado no arsenal numa pistola Taurus 42 e as acertava com balas de verdade.

Treinei até não errar uma.

Minha mira estava afiada.

Pixei rostos de bandidos no sofá e arremessava facas em seus olhos.

Não errava uma também.

A raiva e a tristeza são ótimos motivadores para se atolar em seus abismos íntimos, até encontrar elementos carburáveis que a transformem em ira.

Depois a Ira te dá novos motivos para viver.

Motivos escuros, mas cheios de vitalidade.

A verdade é que eu me sentia vivo, mesmo sabendo, ainda que parcialmente, que tudo o que me movia era pura loucura.

Queriam vir me matar de dó? Como um cão? Pois que venham ver uma coisa, bastardos comedores de carniça.

Eu iria mostrar o que é morrer de verdade.

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