O GOLPE vii–FINAL

defesa

Eu queria viver...

Com a louca que tivera culhões e fizera a tolice de ver se o marido que a deixara louca estava bem no meio de um tiroteio.

Eu a amava por isso e essa loucura toda devolveu-me num instante a ânsia de viver. A esperança de vida.

Desencaixei o escudo com uma porrada violenta e o passei para Regina.

--- Segura esses filhos da mãe enquanto eu boto a gente prá fora daqui.

A gangue entrara em distância de tiro.

Já podia ouvir armas engatilhando.

Ela também ouviu e instantaneamente ergueu o escudo.

Bem a tempo.

Ouvimos juntos o retinir das balas.

Passei a Deseart Eagle, a única arma de fogo que me restara, para ela e gritei.

--- Fode a vida deles. Mete bala!

E foi o que ela fez por trás do escudo.

Minha garota. Mulher como ela está para nascer.

--- Acertei 3.

Mas a munição estava quase no fim.

-- Poupe munição, espere eles estarem bem próximos. Fica por trás deste escudo até lá, depois mete chumbo de novo.

E foi o que ela vez, enquanto eu ganhava distância da gangue impulsionando a cadeira de rodas com todas as forças, ganhando aceleração, cada vez mais rápido para a porta de casa, a saída do inferno de balas, sangue, pedaços de carne.

A casa maculada pelo sangue que escorria pelos ladrilhos e fazia estranhos desenhos no carpete.

Sair, finalmente, da minha loucura.

Hora de mudar os planos e rapidinho.

Mas quando chegar a hora te conto, por enquanto basta saber que restaram cinco da quadrilha.

Regina detonou a perna de um, arrebentou o peito de outro e destroçou o braço da arma de mais um.

Nada mal. Mas sobrara só um tiro.

Hora de passar para a defesa.

--- Segura a onda, ergue o escudo, protege a gente que quando chegar lá fora, eu acabo com essa merda.

E lhe mostrei o celular-detonador.

Senti o horror em seus olhos...

Os bandidos tropeçavam em corpos.

Atrapalhavam-se.

Tornavam-se lentos.

Regina, mesmo assim ergueu o escudo resignada, mas suspirou:

--- Nossa casa... Mas...

--- É o único jeito, baby...

--- Você ainda me paga, Ciro, seu puto.

--- Isso é um ok?

--- Que opção tenho? Se manda, baby, tira logo a gente daqui.

A essa hora, a luz do sol começava a brilhar lá fora, e a porta estourava em luz nos meus olhos.

Quase lá.

Rodei com toda a força que pude a maldita cadeira.

Num impulso final estava fora da casa.

Em outro, achei um lugar que julgava fora do alcance da explosão.

Mandei bala. Apertei o botão.

                             CABUM.

Minha casa explodiu em chamas de cinema.

Encolhemo-nos, Regina e eu, sob a proteção do escudo.

Pedaços de nossa casa bateram nele com toda força.

Minha casa, definitivamente fora para o espaço.

“Os bandidos restantes foram junto...” pensávamos.

Mas um corpo em chamas voou para fora de casa com a explosão.

Júlio aterrissou estrondosamente e passou a rolar como um dublê pelo gramado de minha varanda para apagar as chamas que consumiam seu corpo.

Sem um grito de dor.

Quando as chamas se apagaram, sua mão derretera e fundira-se com a Magnum 44.

Seus olhos sem pálpebras, nem sobrancelhas eram uma geleia mucosa cheia de ódio.

Seu corpo completamente deformado pedia vingança com agonia fatal.

Ele não falou nada, apenas apontou a Magnum para nós e avançou para a distância de tiro.

Tive que ser mais rápido.

Arranquei a Desert Eagle das mãos trêmulas de Regina, apontei, mirei, atirei.

A carne de seu punho, fragilizada pelo fogo e abalada pela explosão, foi completamente arrancada.

A Magnum caiu suave em minha grana.

Aqueles olhos saídos de um filme de terror se borraram.

Ele ficou extático, enquanto eu avançava.

Levava um par de algemas no bolso dianteiro da minha calça, mais como um talismã do que algo que pretendia usar.

Mas confesso que nunca estive tão feliz e pleno quando saquei essas algemas envolvi o punho de Júlio, que a esta altura do campeonato tornara-se um homem derretido patético gemendo de agonia e implorando por sua mãe.

Todo bom bandido implora por ela no final.

Pobres mães...

A desse filho da puta que fosse para o inferno.

Foi com muita satisfação que lhe disse.

=== Esteja preso, bandido filho da mãe!

E nesse momento os carros de polícia, cujas sirenes há muito uivavam em meus ouvidos, chegaram.

Rá, eles sorriram para mim, fizeram positivo com os dedos. Quase me aplaudiram.

Sim, meu caro, virei herói da polícia.

O Comissário foi com a minha onda de bancar o Rambo de cadeira de rodas e me promoveu direto para Capitão.

Passei a ser caso estudado na academia de polícia.

E minha história sempre foi deturpada para o lado bom da força, se é que pode me entender.

Daí, a vontade de mandar ela para você, na Real, sem salameleque.

Ganhei muito e agradeço.

Tenho uma vida confortável e totalmente fora da Vida.

Vivo em paz com Regina e Elisa.

Não fosse Nívio me aplicar o golpe, como falei, nada disso aconteceria.

E eu seria mais um paranoico suicida cuja memória seria apenas lembrada no dia de nascimento e morta.

Caso desse sorte.

De qualquer maneira, algo ruim de ser lembrado.

Portanto, meu destino era o esquecimento e a morte, Nívio, meu parceiro.

Não fosse você, Bandido de Merda, estaria morto e esquecido.

Eu te devia esse respeito.

Mas isso acaba aqui.

Por que se eu te ver fora da cadeia, ou do cemitério, começo tudo de novo...

                                   FIM

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