AS ÚLTIMAS HORAS DE CHARLES SIMÕES–FINAL–LEGIÃO
Quando viu, as trevas espessaram-se, tornaram-se frias.
Gélidas.
Invisíveis cores dançavam em flocos de cristal negro e brilhante, as chamas saindo multicores do seu interior e refratando nas superfícies de prismas pentagonais que flutuavam, negros, disfarçados na grande escuridão ao redor.
Tudo então era cor e escuridão.
E ele, horrorizado, sentiu uma pontada funda no coração.
Era como se quisesse brotar de si, uma flor em feridas abertas, abrindo-se em pétalas de carne feito mandalas.
Uma cor nascendo, má, bela, terrível. Tomando posse lenta e dolorosamente de sua identidade.
Primal e inquestionável.
O mal, o grande mal...
Aquilo que havia antes de tudo.
Agora sabia, era parte dele, eram múltiplos, infinitos. Incontáveis.
Uma sinestesia de cor e sensações tácteis inundou sua inconsciência.
Rugas, seios, olhos, Júlia, a nenê.
A pedra. O carro. Acidente. Morte.
O Inferno em vida.
E sua esquizofrênia.
E agora, o escuro o chamava...
E ele pulsava, iluminando a escuridão com o rubor inesperado de sua chama, um demônio roubando a escuridão, a luz sugada de sua alma.
Para sempre, para sempre, para sempre.
ESQUIZÔFRENICO!
E os pulsares de luz gritaram de volta.
E o afagaram com sinfonias de dores alheias, sofrimentos infligidos e sangue oferecido em profanos e saborosos rituais. Era bom.
Estabilizou sua cor. Indefinível e bela, como um anjo em tormenta.
E agora estava curado. Estava em seu habitat. Junto com seus semelhantes. Pois eram muitos, uma sucessão de infinitos e tormentas.
Agora sabia a verdade.
Pois era parte de uma Legião que tanto temera em vida. Ele mesmo e incontáveis mais, na densa e profunda órbita do Inferno. E não mais sentiu-se só.
E, quando a overdose de ópio sintetizado em laboratórios de terceira categoria sugou a vida de seu corpo, seu espírito saudava seus novos colegas de trabalho em doces pulsares de sublime agonia.
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Mande fumo pro Curupira