UMA NOITE NA URCA COM GETÚLIO–VII-UMA CONVERSA ENTRE AMIGOS.
“E ainda assim verdadeiro...” lhe diz aquela vozinha deprimente que insiste em ir e vir. A velha voz negativa e inconsciente ronda sua mente novamente e Getúlio luta para se livrar dela de uma vez por todas. Quer a todo custo reconciliar-se consigo mesmo.
Afinal estava indo tudo tão bem...
Até Chateaubriand interferir com suas previsões sombrias e rancorosas.
Um homem que de uma hora para outra virou seu inimigo.
Mas não, não era o momento para pensar em inimigos.
Era a hora de esquecer deles.
E crê que ver Marlene é o que precisa no momento.
Com mais uma dose de Canha. Dupla. E um Corona cubano.
--- Menina Marlene, você poderia se apresentar mais uma vez para eu apreciar seu número com calma?
Marlene sorri, vira seu copo, dirige-se ao palco, aciona a orquestra, começa seu número novamente.
Ela é ainda crooner, pode apresentar-se várias vezes e não hesita em atender o pedido de Vargas. Ama o que faz. E o faria a qualquer momento ou a noite inteira, caso precisasse.
Getúlio olha para ela. Ainda é uma menina. De onde dissera que vinha: São Paulo, fugida da família que não deixara ela fazer carreira como cantora na Tupi. Sim, nas emissoras de Chateuabriad.
Quem também olha para Marlene e mais ainda para a conversa que esta tem com Getúlio e a reação que ela nele provoca é Andrade.
Louco por novos talentos, Gilberto Andrade descobrira Marlene há pouco tempo.
Ficara fascinado com seu jeito único de se apresentar: pois ela canta e interpreta e vice-versa. Nunca fica parada enquanto canta.
Desde então cultivava o desejo de contratar Marlene para o cast da Nacional. Mas precisava do aval de Vargas. E sua chance estava bem ali. Não hesitou:
--- Um raro talento, não, dr. Getúlio?
--- Uma rara mulher, meu caro Gilberto – acende seu Corona cubano, beberica a canha – união perfeita de beleza, juventude e talento.
--- O que o dr acha de tê-la no cast da nossa Rádio? Ando pensando bastante na ideia e ela me agrada cada vez mais...
Marlene sacode os cabelos e deixa Getúlio absorto ao que está em redor.
--- Pois contrate, meu caro Gilberto, contrate.
Gilberto de Andrade exulta de alegria. Uiva para os lustres do Cassino. Soca o ar. Dança um rag. Depois agradece:
--- Obrigado dr. Getúlio.
Marlene gira os braços enquanto canta e deixa Getúlio absolutamente atento a cada movimento seu.
--- Chame-me de Getúlio. Hoje sou seu amigo, não seu patrão ou presidente...
--- Sim dr... Quer dizer, sim, meu prezado Getúlio.
Casé cerra o olhar:
--- Sabia que não teria chances de contratar Marlene com o dr... quer dizer com Getúlio aqui...
Gilberto de Andrade acerca-se de Casé. Passa-lhe o braço pelos ombros, da-lhe um abraço.
--- Garanto que o chefe facilitará a livre circulação dos artistas da Rádio Nacional para o Programa do Casé. É outra coisa que gostaria de combinar com você Getúlio.
Marlene requebra quadril e quase deixa Getúlio com torcicolo ao acompanhar seu movimento:
--- Artistas! Para Mestre Casé? Pois claro que sim. Quem Mestre Casé quiser. – diz Getúlio sem nem olhar para seus amigos, totalmente absorto em Marlene.
Casé a queima roupa, sobre Marlene:
--- Até sua última contratação?
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Mande fumo pro Curupira