UMA NOITE NA URCA COM GETÚLIO II–O LEAL ESCUDEIRO

 

                    GILBERTO DE ANDRADE

 

Andrade ouviu tudo aquilo com um frio na espinha. O que acabara de saber deveria ser impossível. Seu patrão, o todo poderoso líder do Estado Novo paralisado diante uma multidão o aclamando. Uma arma embaixo de sua coxa. Alzirinha pensando que o pai queria se matar de dor pela perda de Getulinho e seu Miguel.

Andrade ficara, mais que surprso, atônito. Fizera uma ligação de rotina para checar uma informação para a Hora do Brasil e caíra no inferno pessoal dos Vargas.

E pior, sofria com isso.

Enquanto se dirigia ao Guanabara para socorrer os Vargas, Andrade deixou-se levar pelos pensamentos e recordações.

Admirava Vargas por ser um vencedor. E considerava as vitórias do chefe, conquistas pessoais dele, Andrade.

Pois a Rádio Nacional era sua paixão e Andrade via em Getúlio um aliado para manter o seu amor como a maior e mais querida rádio do Brasil.

Com Getúlio não precisava se preocupar com dinheiro. Altos cachês para um artista eram compensados com programas altamente populares e, embora ricos em criatividade, de baixíssimo custo.

E o chefe sabia do esquema e não se incomodava. Muito pelo contrário aprovava. Até dava sugestões razoáveis, mas, sem jeito, humilde, sempre afirmando ser uma “sugestão de um mero ouvinte”. Andrade era uma das poucas pessoas que podiam vangloriar-se ter visto esse lado mais delicado e frágil do Presidente.

Desde as primeiras transmissões das ondas sonoras do rádio, Vargas era fascinado pela tecnologia e a Nacional era algo mais que especial para o Presidente.

Getúlio amava sua rádio federal, ao ponto da idolatria. Alzirinha sentia isso disto, e por este motivo o convocara para pôr fim à essa situação.

Para sorte dela, Andrade tinha um encontro com grandes amigos e colegas do rádio no Cassino da Urca.

Ao chegar perto do Guanabara pode ouvir os brados da multidão:

GE-TÚ-LIO

GE-TÚ-LIO

GE-TÚ-LIO

Curvou-se para enfrentar a turba.

Voltou seus pensamentos novamente para os colegas e para a Urca e suas promessas de diversão. Pois a noite era de Marlene e todos os seus convidados confirmaram presença.

Até Carmem Miranda iria.

E também Casé,

E Almirante.

E Marlene, ou assim queria e esperava, também viria à mesa deles quando seu número terminasse.

As maiores figuras do rádio e do teatro revista iriam se reunir essa noite.

O que pode mais alegrar um enrustido fã do rádio, suas estrelas e cantoras? Gilberto Andrade lembra-se muito bem quando o dr. Getúlio solicitou um encontro com Angela Maria.

Ao vê-la soltou um longo suspiro, retirou um cubando do bolso, cortou a ponta, levou-o a boca. Acendou o charuto e depois levou-o aos lábios:

--- Menina você tem a voz doce e a pele do sapoti.

Getúlio amava as damas. Principalmente as do Rádio. As rainhas da preferência nacional, eram também a preferência do presidente para a infelicidade de dona Darcy, sua esposa.

Sim, uma noite no Cassino da Urca, uma conversa descontraída com seus ídolos e amigos, um show com Marlene, uma possível rainha, que ele mesmo, Andrade, estava disposto a contratar. E sabia seu chefe amava isso.

E, confiante em seu plano, enfrentou, aos trancos e barrancos a excitação e o clamor da multidão agitada. Deu cotoveladas e empurrões, até ver os cadetes de plantão na entrada do Palácio. Mostrou sua identificação federal de alto nível Guanabara, abriram os portões.

Andrade os adentrou vagarosamente, tentando imaginar em que estado iria encontrar o homem que mais admirava em sua vida.

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