UMA NOITE NA URCA COM GETÚLIO–V-ONDE SE ENCONTRA ASSIS CHATEAUBRIAND
Findo o número de Marlene, Getúlio chamou o maitre do cassino e disparou:
--- Quero-a em nossa mesa!
Porém, o tempo passava e Marlene não aparecia.
Vargas busca-a com olhares em zoom.
Encontra-a num reservado com um homem nas sombras, copos brindando, uma garrafa de champanhe no gelo.
Revolta-se. Afinal era o presidente.
Vai até lá.
Para sua surpresa, Marlene está falando com Chateaubriand. Ele convida Getúlio para sentar, contrariado. Chateaubriand estava comendo Marlene com palavras e olhares e a temperando com bebida. Fica bravo com Getúlio:
--- Olha, dr. Getúlio, no Catete e no Guanabara quem manda é o senhor, que esses são lugares de presidente, mas aqui, no cassino, manda qualquer pessoa que possa. E eu aqui posso mais que qualquer um. Inclusive mais que o senhor.
Getúlio ri.
--- És invencível, dr. Assis.
--- Sim sou – vira o copo de champanhe, enche-o novamente, vira-o de uma golada só. Encara Getúlio, os olhos vermelhos, alcoólicos:
--- E o senhor, dr, acha-se invencível também, não é mesmo? Nem a radio Tupi dos meus diários associados chega aos pés da sua Nacional. Parabéns senhor presidente. Sua rádio sozinha derrotou toda a minha cadeia nacional. E ainda sou obrigado a transmitir aquela porcaria que o dr. me impõe, sabe o que é, não é mesmo? Oras, meu caro, a Voz do Brasil. Mas isso não vai durar para sempre, senhor presidente, escute o que lhe digo, pois lhe prometo.
--- Não entendi sua promessa dr. Assis...
--- Pois bem, vou ser mais claro. O rádio morreu e não sabe. Acabei de chegar da América. Há uma nova tecnologia que transmite imagem e som para um receptor que não só reproduz os sons, mas também, as imagens. Como um cinema em casa. É a Television. Televisão. Já comprei a tecnologia. O planejamento já está feito e a Televisão, ou TV, será implantada aqui em 1950. Só tinha um problema que o senhor acabou de me dar a inspiração para resolver.
--- E o que seria?
--- Tenho a tecnologia e tudo o mais, mas não tinha os profissionais. Mas, depois de falar com o senhor, vejo-os daqui de onde estou...
Getúlio sente um calafrio. Olha para seu reservado onde bebe-se, fuma-se e ri.
--- Sim, senhor presidente. Os profissionais virão do rádio, da sua amada Nacional para a minha folha de pagamento. Os seus amigos serão meus funcionários. E a Nacional será apenas uma sombra do que era.
--- O senhor é cruel com quem sempre lhe tratou e o considerou muito bem, senhor dr.
--- A natureza é cruel? Não, meu senhor, ela é adaptativa. A tecnologia, como a natureza tem que evoluir. E os que não seguem sua evolução...
---... são extintos.
---... tornam-se obsoletos, meu caro dr. Presidente. Só estou lhe aconselhando. Não se torne obsoleto. Isso sim, causaria a sua extinção.
Getúlio fica perplexo com a conversa. Fecha-se em copas. Olha para Chatô abismado, mas firmemente, como quem espera uma confirmação do que ouviu que só os olhos podem dar. Chateaubriand percebe o olhar e ri.
Marlene que a tudo assiste, fica compadecida de Getúlio, toma-o pelo braço e o reconduz a seu próprio reservado, onde senta-se a seu lado e imediatamente começa a conversar com o presidente.
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Mande fumo pro Curupira