QUIMICA VORAZ III–OU DIÁRIO DA ADAPTAÇÃO AOS REMÉDIOS
Sonho que estou de volta à:
Clínica Psiquiatrica – dia – conversa com enfermeira.
Não consigo resistir à depressão tenho que desabafar.
Faço-o com ela. Conto minha patética historia de tentativa de matar-me por um suposto amor. Como os românticos. Disse que queria um filho.
--- Para que? Vc não sabe o que é ter e criar um filho hoje.
Assenti em silêncio. Não sabia nada.
--- E outra, você amava mais a outra, do que você mesmo.
Outra bola na rede.
Silêncio.
Ela percebe a abertura e manda brasa:
--- Sabe, eu tive muitos problemas de auto-aceitação. auto estima mesmo, entende… Demorou para aceitar essa cicatriz. Levanta a camisa. Uma longa cicatriz vertical divide sua barriga em duas enormes metades. Ela é gordinha, mas não é o fato de ser gordinha que a incomoda. O jeito com que levantou a camisa, normal, sem grilos de mim, nem pudores desnecessários é que revelou, para mim, essa atitude de ser gordinha e não estar nem aí.
A cicatriz sim, a incomodava.
Ela confirmou a seguir.
--- Aprendi a gostar de mim, na marra, mas aprendi. Sofrendo e aceitando a fatalidade dessa marca. Não tenho como vence-la, então aceito-a como parte de mim. Como as gordurinhas que me compõem.
--- Você é sabia, digo.
--- Não sou não, a vida é que é holística e manda as oportunidades exatas para o que sou. Chances. Elas batem à minha porta. Só tenho que abri-las. Sei quando a vida bate nela. Talvez por isso seja sábia.
E agora,
Casa – MADRUGADA – TOMBO.
Tento alcançar o papagaio para soltar o fluxo.
Faço-o, o desgraçado transborda.
Mais um dilúvio no quarto.
Depois outro.
E mais outro.
Finalmente, sem energia, caio da cama.
Levanto-me em escorregões no chão molhado.
Deito-me na cama úmida.
Cansado, vejo que meu sono será picado, molhado e frio.
Como a garoa que bate à minha janela.
Com isso durmo de vez…
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Mande fumo pro Curupira