O NAIF DE UMA MENINA MULHER–MARIA BRANDÃO E SUAS REFLEXÕES

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A primeira lembrança que tenho de Maria Brandão é uma almofada pintada com um tucano lindo.

Ainda criança enchi-a de ervas. Lavanda, alecrim, manjericão.

O que pude encontrar em casa.

Tinha então nove anos.

Redescobri essa almofada há cerca de 5 anos.

Cheirosa, mas amarrotada.

Infelizmente ela se perdeu numa de minhas várias mudanças.

Uma perda de valor sentimental inestimável.

E talvez tenha perdido também uma boa grana.

Maria Brandão já expôs no Metrô de New York e no MOMA.

Mas sempre prestei atenção nela.

Tenho um grande Pirarucu dela:

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Foi paixão à primeira vista.

O contraste do vermelho das finas listras do corpo do peixe com o a forma cinza praticamente feita de cor e o azul do fundo saltaram aos meus olhos.

E o tamanho do quadro.

Ele consegue capturar a nobreza e a beleza do Pirarucu, bem como a de um Boto cinza:

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Aqui o contraste é feito em três cores, o verde que emoldura o fundo salmão forte, quase marrom, e a forma também desenhada com pura tinta azul claro.

A forma pintada em cima do fundo destes dois quadros revela uma sadia criança interior que mora em Maria Brandão e é extravasada em seus quadros.

Não se pode dizer que Brandão quer ser jovem para sempre. Mas sim, que quer ser criança e brincar com as tintas enquanto houver ar em seu peito.

Pois sua arte vêm desse coração criança que pensa a si própria e o ser humano assim:

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Ela consegue fazer um auto-retrato absolutamente abstrato, pueril e belo.

Não só dela, como indica o texto da imagem, mas também de todos nós.

Nós, seres humanos contemporâneos estamos sempre com nuvenzinhas de pensamentos desencontrados povoando nossa cabeça.

E, interessante, somos tão imersos nessa miríade de pensamentos que até perdemos a nossa identidade, a nossa face.

Mesmo o céu estrelado, apesar de alegre, indica um brainstorm noturno típico da insônia.

Portanto, se Maria Brandão tem um traçado fino e lindamente infante, sua temática, nem tanto.

É mais seria do que seus traços indicam.

Os próprios quadros de animais, que são, hoje, raros ou à beira da extinção, apontam para uma vontade ambientalista intensa da artista em preserva-los. Seus quadros, feitos como quem observa a natureza e toma notas de seus seres, observa-os, estuda-os, retrata-os.

Como uma naturalista o faria.

Então, pinta-os de uma maneira que, com poucos detalhes, consegue capturar sua essência:

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Maria Brandão é essa menina-mulher:

consciente da realidade que a cerca e intervindo, as vezes com ironia, como no caso do auto retrato, outras vezes, principalmente em sua série sobre animais, com verdadeira preocupação ecológica.

Isso revela uma artista que consegue misturar sua criança interior com a sabedoria da idade madura.

Se por um lado, o traço é propositadamente e estudadamente inocente como só uma criança pode ser, em seu diálogo com quem o contempla, suas obras revelam significados maduros de uma mulher que pensa sem deixar de sentir.

E sente sem deixar de pensar.

Com isto Maria Brandão atinge um equilíbrio raro na arte Naif.

Um equilíbrio que nos desvenda o olhar e quer nos arrebatar.

E arrebata.

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