O VENTO SABE A RESPOSTA - PARTE I - O PESADELO
Ele chegou à cama com suas últimas forças e não dormiu. Estava
muito fatigado, sua rotina diária era carregada de exercícios e fisioterapia.
Sofria de um estranha tensão dos nervos dos braços que não lhe permitia sequer
segurar um livro direito.
O cansaço não induzia-o ao sono, muito pelo contrário, provocava
dores nos nervos inflamados que tratavam de mantê-lo acordado. Depois de muito
tempo, sentiu a clemência do sono e conseguiu fechar os olhos.
Foi quando ouviu o vento uivando.
Mas, ao olhar a rua pela janela aberta, por sobre o baixo muro
de relvas, as arvores da calçada estavam paradas sob um pálido luar, quase extáticas.
Podia-se, tão pesado o silêncio, ouvir a respiração das plantas.
Não havia vento lá fora.
Mas o uivo continuava, o vento entrava pela janela, sacudia as
cortinas como ondas agitam um bote numa tempestade em alto mar.
Calafrios percorreram seus nervos tensos.
E gritou quando o vento bateu a porta do quarto.
Um susto nada mais, chegou a pensar.
Foi quando o vento atravessou seu corpo.
Agonia. Sombras. Dor. Morte.
Foi o que sentiu.
E quando o vento derrubou a imagem de nossa senhora aparecida
que havia em sua mesa de cabeceira, tudo acabou.
Despertou ofegante.
A porta do quarto estava aberta.
Olhou para a mesa de cabeceira.
A imagem da santa permanecia intacta.
Levantou-se, foi ao banheiro, olhou-se no espelho, achou-se um
caco.
O cabelo todo suado, colado ao rosto. O negrume azeviche dos
olhos inchados, esgazeados e sem vida. As veias da testa latejavam.
Uma dor de cabeça estava por vir.
Abriu o armário do banheiro, seu reflexo substituído pelas
pequenas prateleiras onde guardava seus remédios.
Engoliu duas dipironas, tanto para prevenir a dor de cabeça,
quanto para baixar sua pressão e lhe garantir uma volta tranquila ao sono.
“Preciso dormir, amanhã volto ao trabalho”.
Voltou ao quarto, abriu a gaveta de sua mesa de cabeceira, tirou
de lá uma vela e um isqueiro bic azul, cor que, sabia, era a predileta de sua
santinha.
Acendeu a vela mais por crença do que por fé.
A dipirona fez efeito, virou-se de bruços e dormiu.
Não reparou que a imagem, antes no meio da mesa, estava bem na
borda, quase caindo...
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Mande fumo pro Curupira