QUE VÁ–A CIDADE V

 

 

ESTRADA DESERTA

I

O cartaz xinga meus olhos enquanto passo.

Passar, passar.

Ir, ir.

Não posso parar.

Eu não quero essas ruas.

Elas não me querem.

Vou-me embora.

Passar.

Ir.

A menina de bicicleta é só um borrão distorcido.

O amontoado de lojas e casas, o declive, a ladeira,

O buraco, o fundo, o concreto e o rio.

Meia volta volver

A subida.

II

Ir, ir, ir,

Mesma ida

Mesma volta

Mesmo Sisífo,

Mesma rocha.

Não pense.

Não pare.

Só passe.

III

Passo e deixo a vida passar.

Tudo a minha volta

É uma conspiração de gordos minotauros,

Corpos humanos em cabeças de bois domados

Vagando pelas ladeiras deste labirinto morno,

Tristezas trancafiadas e secretas alegrias

Muros, muros, muros

Passo, passo, passo.

Desisti de parar.

Não há oásis, apenas guetos,

leitos de rios secos e poluídos.

Cágados morrendo de inanição.

Olhares baixos cruzam minha passagem.

Não escuto nada, não quero ver nada.

Mas tudo explode a minha volta

Na lentidão das tardes vazias.

Passe, passe, não pense, não pare.

Seja incógnito.

E só.

 

SO

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